29 de janeiro de 2011

Eu tenho a força?

Mais presente nos consultórios de terapeutas sexuais, o homem demonstra maior preocupação em satisfazer a parceira na cama e passa até a discutir a relação, mania tipicamente feminina

Não é de hoje que a auto-estima masculina anda baqueada. Desde que as mulheres se liberaram, o desempenho na cama e o tamanho do pênis – que tanto faziam os homens se vangloriar – viraram tema de questionamentos. Os homens saíram de uma situação na qual davam as cartas e decidiam quando e como jogar para enfrentar a parceria. Não só o que idealizam mas também o que acham que as mulheres esperam gera ansiedade. Têm ainda de administrar o medo do desemprego, a competitividade, o stress. Resultado: consultórios de sexólogos e terapeutas de casal vivem lotados. O Projeto Sexualidade (Prosex), do Hospital das Clínicas de São Paulo – que oferece ajuda psiquiátrica para distúrbios ou dúvidas sexuais –, recebe em média de 240 novos pacientes por mês. Desse total, 160 são homens preocupados com excesso ou falta de desejo, impotência, disfunção erétil e ejaculação precoce.

“Hoje o prazer dos homens está comprometido com o prazer feminino. Eles ficam inseguros porque a mulher reivindica, deseja, é parceira e compara”, diz a sexóloga Carmita Abdo, coordenadora do Prosex. O aspecto positivo é que a mania feminina de questionar o relacionamento, coisa que eles sempre repudiaram, está deixando de assustá-los tanto. O papel ativo das mulheres forçou essa reavaliação. Afinal, eles não precisam ser apenas viris. Têm de ser sensíveis, atenciosos e, claro, bons de transa. O grande desafio ainda é acertar o passo na cama. O problema é que as diferenças entre a sexualidade masculina e a feminina ainda confundem muito. Por que eles sempre querem mais? Por que estão sempre prontos para o sexo? Por que, enfim, a maioria dos homens transa para relaxar e a mulher precisa relaxar para transar?

Muitas razões para essas desigualdades são fisiológicas mesmo. Não tem jeito. Para começar, os homens carregam no organismo uma quantidade mais elevada de testosterona – o hormônio responsável pela libido, pelo tesão (leia quadro). Enquanto elas vivem mensalmente marés altas e baixas de hormônios provocadas pelo ciclo reprodutivo, eles são mais estáveis. “Um homem pode ter de 350 a 1.000 nanogramas de testosterona por decilitro (ng/dl) de sangue. No corpo feminino, o número gira entre 30 e 90 e aumenta até 50% no período ovulatório, o que justifica a libido em alta nesta fase”, explica o urologista Joaquim Claro, da Universidade Federal de São Paulo. Enquanto as mulheres têm de 20 a 30 ng/dl de estrógeno, eles têm no máximo 5ng/dl. Este hormônio faz a mulher mais emotiva e sensível. “Por isso a mulher é um ser essencialmente romântico e o homem, sexual”, conclui o endocrinologista paulista Antônio Roberto Chacra.
A anatomia também explica as diferenças. Os órgãos masculinos estão à vista e proporcionam uma relação mais descontraída com o próprio sexo. A simples manipulação a cada vez que vai urinar faz o homem criar uma ligação “de amizade” com o próprio pênis. Não é raro ele ser batizado com nomes próprios, como Zezinho, Júnior, Bráulio, Ricardão. Já no século passado, o poeta alemão Johann Wolfgang von Goethe registra essa intimidade em O diário quando versa sobre um homem frustrado com a incapacidade sexual trazida pela idade. Sem poder atender aos desejos de uma jovem, o personagem incita o pênis à ação chamando-o várias vezes de Mestre. Para a mulher a relação com os genitais, e consequentemente o orgasmo, é mais difícil. Como seus órgãos estão mais escondidos, ela manipula menos, e quase sempre por debaixo do pano. Ganha ao desenvolver uma sensibilidade mais difusa no corpo e perde ao não explorar sua sexualidade. Por outro lado, o homem corre o risco de centrar o seu prazer apenas nos genitais. “Desde que o mundo é mundo é assim. Como o órgão sexual da mulher não tem penetração, sua identificação é com o corpo. Ela quer abraçar. O homem quer atingir”, afirma Carmita Abdo. O psiquiatra Moacir Costa, especializado em sexualidade pela Universidade de Cornell (EUA) e autor dos livros Sexo: minutos que valem ouro e A pílula do prazer, mensura a perda masculina: “Alguns homens têm um bloqueio tão grande que só sentem prazer quando os toques se concentram lá. No resto do corpo, eles têm cócegas nervosas. São tensos e não desfrutam das mais de 100 mil terminações nervosas que possuem.”

Por tudo isso, a mulher é tátil, olfativa e auditiva enquanto o homem é muito visual. “O homem vê uma mulher e já faz um filminho”, explica Costa. Por isso as revistas masculinas fazem tanto sucesso. Mas nem é preciso tantas Tiazinhas e musas do Tchan para explicar a disposição masculina. Na rua, no escritório ou em qualquer parte onde haja uma mulher interessante, ele está recebendo estímulos eróticos.
Entender e aceitar todas essas diferenças é um ótimo começo para afinar os desejos na cama. Jovens ou mais maduros, muitos homens estão deixando para trás o estereótipo do machão e não se envergonham mais de ser sensíveis aos anseios da companheira. Para o cantor Maurício Manieri, 29 anos, o prazer da parceira na relação é fundamental. “Me excito ao vê-la excitada, principalmente nas preliminares. É o momento mais gostoso da relação”, diz. O que aconteceu com a geógrafa Carolina Peixoto Ferreira, 25 anos, mostra bem a mudança. Depois de terminar um relacionamento de três anos, ela estava disposta a ter somente namorados mais velhos. “Eu queria alguém atencioso e generoso na intimidade. Achei que só encontraria essas qualidades em homens mais maduros”, lembra ela. Sua tese caiu por terra quando encontrou o pesquisador Francisco Paes, 21 anos.

“Conversamos muito sobre o que gostamos e queremos. Ele é maduro”, descreve. O novo namorado credita o descompasso entre os sexos à desqualificação da sexualidade. “Até as palavras mostram isso. Transar é diferente de fazer amor. Percebe-se a diferença no ‘depois’. Se o casal acaba e automaticamente acende um cigarro, transou. É como uma descarga. Se o casal fez amor, fica mais duas horas abraçadinho. Sexo é apenas uma parte da relação. A pressa atual faz as pessoas transarem só para contabilizar”, teoriza.

Segredo – O gerente de vendas Flávio Pinotti, 37 anos, é casado há 12 anos com a representante comercial Léia, tem duas filhas e acha que o segredo do seu bom relacionamento é não ignorar as diferenças e administrá-las. “Tenho amigos que não aceitam uma recusa, acham que é desinteresse e azedam o relacionamento. Não sabem conversar. Saber a hora certa e não forçar a barra é uma questão de respeito”, diz. Flávio já aprendeu que não deve esperar da mulher reações sexuais imediatas. “O homem tem uma necessidade física de sexo. Já a mulher se prende na atenção que recebe, na conversa, no ambiente”, discorre.

Os ingredientes socioculturais da relação complicam ainda mais o entrosamento e o desempenho. A casa, as ruas, as rodinhas de bar ou os vestiários masculinos são um campo minado pelo machismo. “O homem é incentivado a mostrar sua masculinidade por meio do sexo e não do sentimento. Acha, inconscientemente, que demonstrar carinho e afeto o aproxima da homossexualidade e acaba extremamente genitalizado”, aponta a psicóloga Aparecida Favorêto, diretora do Instituto Paulista de Sexualidade. O processo começa cedo. “O pai gosta de alardear as medidas do pênis do filho, como se isso significasse potência, poder. O tamanho e a capacidade de urinar mais longe são associados à coragem e capacidade. O valor da mulher nunca esteve associado a quantas vezes ela se masturbou ou teve orgasmo”, diz o psiquiatra Moacir Costa. Mas esse mito se perpetua entre os homens, mesmo que a ciência comprove que o tamanho do pênis não tem relação direta com o prazer que ele proporciona.

Incorporadas já na infância, essas idéias podem provocar um desastre quando se entra na vida adulta. “O número de homens com ejaculação precoce ou impotência aumenta a cada dia. E 20% estão entre 18 e 25 anos. De cada dez jovens, um tem problemas sexuais”, contabiliza Costa. Até meados dos anos 70, ser rápido no gatilho fazia parte do ideário masculino. Não conter a ejaculação era uma prova visível de excitação e, mesmo que a parceira ficasse na mão, podia se sentir lisonjeada. Com a valorização do prazer feminino, o descontrole passou a ser visto como desequilíbrio emocional, capaz de esfriar a relação. Nos casos mais graves, o homem passa da apatia à impotência. É bom lembrar aqui o que diferencia a ejaculação precoce de “uma rapidinha”. O sexo impetuoso, realizado em situações e lugares inusitados, como o elevador, o escritório e até uma praça, tem como ponto de excitação o possível flagrante. Neste caso, o orgasmo vem rápido, mas para ambos. “Na ejaculação precoce, o homem goza antes da companheira, encerrando a relação”, explica o urologista Eduardo Bertero.

Na juventude, a ejaculação precoce é considerada natural pelos médicos. O nível hormonal está lá em cima, as parceiras são muitas e as expectativas também, o que aumenta a ansiedade. O estudante Pedro Marinho, 17 anos, já passou por alguns tropeços. No ano passado, foi para cama com uma mulher de 23 anos. Mentiu que tinha 18. Mas, quando não foi capaz de segurar e gozou rápido, se denunciou. “Ela virou e me disse. “Já? Quantos anos você tem? Tive que confessar”, conta. O bom é que Marinho não fez disso um drama. Mas a maioria dos jovens não tem esse preparo. Um garoto superprotegido que não conhece o seu corpo e tem uma aliança fraca com o pai tem grandes chances de tornar perene uma dificuldade momentânea da juventude. “A ejaculação precoce, apesar de não ter origem física, é responsável por 60% das consultas”, atesta o urologista Joaquim Claro.

Mas o que acontece para um grande desejo virar sofrimento? “A ansiedade enche de adrenalina toda a área pélvica, em particular os corpos cavernosos do pênis. As artérias se contraem, prejudicando a irrigação responsável pela ereção. Dependendo da descarga de adrenalina, o homem ejacula com o pênis flácido”, explica Bertero. Alguns homens ejaculam dançando com uma namorada e, pior, até antes de uma prova ou reunião importante. Todos conduzidos pela ansiedade. Fazer sexo é como tomar um ansiolítico. Eles transam ou se masturbam só para relaxar. Utilizar do artifício de vez em quando, tudo bem. Mas pode virar uma dependência. “O masturbador compulsivo é um ansioso crônico”, diz Moacir Costa. Não é à toa que boa parte dos homens gosta de transar pela manhã. Quando os dias estão pesados, o trabalho está complicado, a ansiedade deles é tanta que, somente depois de uma longa noite de sono, eles conseguem relaxar e entrar com tudo numa relação.

Mesmo assim, é importante alertar que pênis ereto pela manhã não é sempre sinal de tesão, pelo contrário. “Na maioria das vezes, é pura vontade de fazer xixi”, explica Joaquim Claro. “A bexiga fica cheia e pressiona os músculos da ereção”, completa. Desde pequeno, o homem tem à noite cerca de cinco ereções espontâneas, de dez a 30 minutos cada uma. “É um recurso natural para que o pênis conserve suas funções eréteis”, avalia Claro.

Mas por que o orgasmo masculino parece tão mais forte, pleno e absoluto? Por que ele fica sempre tão extenuado e ela não? “Na fantasia adolescente, a mulher espera que a terra trema e os sinos toquem. Quando vê que isso não acontece e que o homem fica entregue, acha que para ele foi muito melhor”, afirma o ginecologista Malcom Montgomery. A diferença é que o desejo masculino e o feminino traçam um gráfico igual quando estão subindo, mas com o orgasmo a capacidade de excitação do homem zera e a mulher fica num patamar ainda excitável. Isso dá a muitos homens a sensação de que ela não ficou satisfeita. Não é verdade. “Ela é capaz de ter outro orgasmo a seguir, enquanto ele precisa de um intervalo para recuperar as forças, um tempo que pode variar de 15 minutos a três horas”, explica Montgomery.

Se a natureza prima pela singularidade, não seria sábio sonhar com a igualdade. Até porque a vida ficaria muito sem graça. O caminho para a sintonia talvez esteja em namorar bastante para achar o par ideal. “O namoro é a iniciação de trocas afetivas, como um pré-vestibular para a vida sexual prazerosa. É o que falta na maioria dos casamentos”, constata o sexólogo Moacir Costa. É também a solução pregada pelo corretor Luiz da Silva Amaral, 37 anos, divorciado. “O sexo vai ser sempre diferente para o homem e a mulher. O jeito é não medir esforços para achar um parceiro compatível.” Pai de um casal de filhos de seis e oito anos, ele jura que dará o conselho tanto para a menina quanto para o menino.

Libido em gel

A partir de julho, os americanos poderão chegar no balcão da farmácia e pedir uma caixa de libido em gel. Isso porque a indústria farmacêutica americana desenvolveu um produto mais confortável que os adesivos e injeções para a reposição hormonal. Trata-se do Androgel, a testosterona sintética que se usa como creme, produzida pelo Laboratório Unimed. De imediato, o gel facilitará a vida de mais de quatro milhões de americanos que sofrem com baixas taxas de testosterona e se submetem a tratamentos para recuperar o apetite sexual. A queda hormonal masculina, conhecida como andropausa, provoca também diminuição da capacidade respiratória, perda de massa muscular e do prazer de viver. “A partir dos 40, a cada dez anos, o homem perde cerca de 10% do total de testosterona porque a função testicular diminui”, explica o urologista Joaquim Claro. Mas o problema não atinge a todos. “Só 20% dos homens sentem a andropausa. São os que tiveram taxas mais baixas durante toda a vida”, completa o médico.

O hormônio sintético não é solução para todos os males. Se usado sem prescrição médica – como anabolizante, por exemplo – traz riscos à saúde. Pode atrofiar os testículos, causar aumento excessivo das mamas e até a infertilidade. Vale lembrar que nem todos os homens que se sentem abatidos com a idade estão carentes do hormônio da libido. Há também os fatores psicológicos. “Muitos dos que se julgam na andropausa, na verdade, se acomodaram às limitações da idade, estabelecidas pelo senso comum. Com a aposentadoria e sem atividades sociais, a pessoa acha que está no fim”, ressalta o psicanalista Paulo Ceccarelli. “São pessoas que se aposentam da vida.”

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